quarta-feira, 16 de março de 2011

Redes Sociais na Educação

Cenpec entrevista Margarita Gomez, autora do livro Educação em Rede Uma visão Emancipadora

Formada em Ciências da Educação na Argentina, mestre em Comunicação pela Universidade de São Paulo e doutora em Educação pela mesma instituição, Margarita Gomez é autora do livro "Educação em rede: uma visão emancipadora" (Cortez Editora).

Atualmente, é professora do mestrado em Educação na Universidade Vale do Rio Verde (Unincor/MG), onde desenvolve pesquisas na área de formação de professores, educação à distância e em rede.

Em entrevista ao Cenpec, Margarita fala sobre os benefícios do uso das redes sociais nas escolas, mas ressalva: "O fortalecimento da rede não basta se não for acompanhado pelo cuidado das pessoas, alunos e professores, e da vida em particular".


Por que trabalhar em rede? De que modo o aluno e o professor podem se beneficiar desse trabalho em rede?

Porque o trabalho em rede permite compartilhar experiências e conhecimentos através do diálogo e da comunicação; permite formar comunidades e fazer coisas junto com outras pessoas, combinando situações presenciais e online. Trabalhar em rede tornou-se em parte uma necessidade, a partir do momento em que a economia foi aos poucos deflagrando modos descentralizados de produção, sustentada na informação e no conhecimento.

Certamente, o sistema educativo está atrelado a essa economia que, de alguma maneira, responde em termos de ganhos ou perdas em vez de enriquecimento mútuo por um processo educativo solidário e humanista. E, mesmo que as redes sociais mais conhecidas no âmbito local não tenham sido criadas para educação, o aluno e o professor podem se beneficiar quando adquirirem autonomia para decidir pelo trabalho em rede, pois ele não se dá por decreto. A rede é mais um espaço da escola contemporânea que necessita orientação e cuidado para se transformar em um dispositivo pedagógico.


De que modo o uso das novas tecnologias e das redes devem estar contemplados no projeto político-pedagógico da escola?

Depende do projeto da escola. Acredito que o uso das tecnologias da comunicação e da informação e das redes sociais devem estar contempladas no projeto pedagógico da escola, em primeiro lugar, quando considera a cultura como um dos eixos do processo de aprendizagem. Uma escola que desconsidere a cultura de seus membros, dificilmente vai ter interesse de conhecer a cibercultura ou a cultura de cada um.

Assim como temos no contexto de cada projeto político-pedagógico uma sustentação teórica do que entendemos por educação e uma explicação a partir da própria experiência, pode-se dizer que nas práticas educativas com a internet também temos uma sustentação legal e metodológica.

No Brasil, especificamente nos últimos dez anos, tem-se implementado legislações que cuidam do uso da tecnologia na educação. Por exemplo, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB nº 9.394/96) legisla sobre a formação e a acessibilidade às tecnologias da informação e da comunicação(TICs). Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN's), seguindo essas orientações, se voltam também para a aquisição e o domínio conceitual, procedimental e atitudinal, de maneira interdisciplinar, de um conjunto de saberes tecnológicos considerados relevantes e significativos para a educação contemporânea. Esses conteúdos também estão relacionados aos temas transversais.


É correto afirmar que, para os professores, as redes podem ter um duplo uso: tanto na sua formação como nas práticas dentro e fora de sala de aula?

Para os professores estar na rede é uma multiplicidade. Tanto pode ser parte da sua formação inicial e continuada, presencial e/ou à distância, quanto das práticas em sala de aula que conformam o mesmo universo. É evidente que a formação do professor vai além do curso de graduação inicial. Ela se estende por toda a vida e sua atuação numa gestão democrática ultrapassa os muros da sala de aula. A sua prática é estendida em outros âmbitos, integrando a educação formal com a chamada educação informal. Tudo é possível, embora as condições de trabalho não sejam adequadas e, por vezes, impeçam a dedicação e articulação do professor ao universo cultural e tecnológico atual.


Uma das características das redes é a horizontalidade das relações, a ausência de hierarquias. Logo, como ferramenta pedagógica, exige uma outra postura do professor, que assume um novo papel. Você poderia comentar essa quebra de paradigmas imposta pelas novas tecnologias?

A rede só é aparentemente horizontal pelo fato de que muitas pessoas lêem, escrevem e falam entre si usufruindo dela. Nesse sentido o aluno pode se informar tanto através do professor como da rede e aí temos que esclarecer que informação não é conhecimento e conhecimento não é educação. Claro que se nos referimos a um professor tradicional, que observa as hierarquias mas que a partir do uso das redes muda o seu modo de pensar e fazer educação estaremos frente a uma ruptura epistemológica, o que não necessariamente pode ocorrer simplesmente porque ele usa a internet, já que ele pode usar a rede com um viés de controle e com restrições e não de maneira aberta e democrática. Somente quando o professor der sentido ao seu fazer na cibercultura ele possibilitará sua autonomia e a dos alunos. 


É essa mudança de postura dos educadores um dos maiores desafios para utilização das novas tecnologias na educação em todo o seu potencial, visto que os professores não são formados para tal?

A mudança de postura dos professores será uma decorrência do acesso, uso e recriação da rede. Não se deve colocar o professor como protagonista das mudanças no viés daquele que não foi formado para tal situação, mas sim como aquele que aprende ou pode aprender  permanentemente e por isso ensina.

As mudanças que a internet traz para a educação advêm da convergência dos investimentos que as políticas públicas fazem em educação e na profissão docente. A mudança é lenta e não educamos na busca de ganhos ou perdas, mas sim na busca da humanidade, da solidariedade. Se aceitamos que neste mundo se usufrui só do que se compra e se vende, do que se consume, a educação como direito social e como possibilidade de humanização terá acabado e as redes poderiam contribuir mais para a ignorância do que para o esclarecimento. O fortalecimento da rede não basta se não for acompanhado pelo cuidado das pessoas, alunos e professores, e da vida em particular.

Nenhum comentário:

Postar um comentário